segunda-feira, 23 de junho de 2014

A sombra é a parte mais calma da tempestade

O céu estava especialmente lindo naquele amanhecer. O tom meio avermelhado, puxando para o azul e anil das nuvens de chuvas próximas parecia pintura a óleo.

Ela admirava a paisagem de cima do seu cavalo, apenas esperando o sinal, porém a nostalgia a prendera naquilo que um dia chamava de lar.

Sete infernos, pensou. Por qual motivo as lembranças se tornavam cada vez mais fortes e nítidas? Ela gostaria de apagar todo o seu passado, ele já não lhe servia mais. Era agora uma fora da lei, viajante e dona das próprias vontades. Sabia que eles estavam vindo e iriam pegá-la. Mas não tinha medo. Tinha medo por não ter medo.

As pontadas na cabeça pioravam a cada segundo. Lembrou-se que estava completando seu vigésimo segundo dia de seu nome. Onde estaria se tivesse permanecido? Provavelmente seria senhora  de algum lugar qualquer, que nem lhe importava o nome, tão infeliz que acabaria morrendo. Se fosse para morrer, que seja com honra, e levantou o olhar. O sol já aparecia.

A sombra é a parte mais calma da tempestade, alguém lhe dissera. Ou talvez fosse de algum sonho, ela não se lembrava.  Agora compreendia. Sombras eram silenciosas, astutas e muito inteligentes. Agiam enquanto ninguém percebia. Porém, olhando para as nuvens acima dela, percebeu que sombras não a assustavam. 

Eram sombras, nada mais que inofensivas. E sentiu-se calma como uma sombra quando ouviu o galope de cavalos atrás dela. Seus receios e medo- o único que tinha- eram sombras na tempestade de sua vida. E ela mesma tornar-se-ia em sombra dali a alguns instantes.


Por fim, antes de sentir o gosto do aço chegar ao fundo da garganta, a ultima coisa que pôde pensar foi que a sombra é a parte mais calma da tempestade.